A fantasia não é exactamente uma fuga da realidade. É um modo de a entender.
(Lloyd Alexander)



sábado, 19 de fevereiro de 2011

Esperança


Havia passado apenas um mês desde que chegara àquele lugar e a tosse e as dores no peito tinham melhorado significativamente. Sem dúvida que o clima ameno e civilizado do campo muito tinha contribuído para isso. A calma dos dias e a tranquilidade das noites revigoravam-lhe não só o corpo débil e fragilizado, mas também a mente, renascendo-a a cada dia. Mas acima de tudo era a distância da sua vida que melhor lhe fazia. A ausência das preocupações laborais e da azáfama de uma cidade agitada e poluída como Lisboa, parecia ser a melhor cura naquele momento. Matilde não podia estar mais grata pela insistência exaustiva da sua irmã, para que passasse uns tempos longe de tudo isso. Joaquim e Custódia tinham-na recebido em sua casa, um pequeno paraíso perdido nas planícies alentejanas, com toda a simpatia e hospitalidade como se ela fosse da família.

Todos os dias Alzira, a não menos simpática e prestável empregada, lhe preparava um aromático chá de ervas, que apanhava no jardim da casa todas as manhãs pela fresca. Uma efusão milagrosa que penetrava no íntimo dos seus pulmões, como uma injecção temporária de alívio e bem-estar. Sentada no banco de pedra do alpendre junto ao enorme pote de barro, de onde brotavam belas rosas silvestres e na agradável companhia do canto matinal dos pássaros, que num coordenado vaivém saltitavam de árvore em árvore, Matilde saboreava o seu chá com toda a calma do mundo, deixando que o seu aroma quente e apaziguador a perfumasse lentamente por dentro, inundando o seu peito de esperança. Esperança por melhores dias, sem dores e sem sofrimento. Sem desejar estar onde não estava e desejar ter o que não tinha. Esperança de voltar a sorrir com a confiança que sempre sorrira e voltar a abraçar o tempo sem medo.

- Bom dia. Como se sente hoje? - Interrompeu delicadamente aquele momento, com um sorriso afável.
Matilde ofereceu-lhe um sorriso franco e animado, enquanto Custódia se sentava a seu lado - Sinto-me muito bem. Este lugar é absolutamente fantástico.
- Sim, é. - Confirmou, acompanhando-lhe o olhar que voltava a dispersar-se pelo campo à sua frente.
- Não sei porque razão nunca tinha vindo aqui antes. É tão calmo, tão lindo...
- Está aqui agora e isso é que importa. - Tranquilizou-a com ternura - Vamos sempre a tempo de fazer as coisas que nunca fizemos.
- Obrigado por me receber tão bem. A Custódia e o Joaquim têm sido como uma família para mim. E a Alzira estraga-me com mimos. Este chá é divino.
- É um prazer tê-la aqui. E a Alzira é mesmo assim. Vive para o bem-estar dos outros. Aproveite os mimos dela, são únicos e sinceros.
- Vou aproveitar. Sabem tão bem.
- Que está a ler? - Perguntou interessada, referindo-se ao livro pousado no banco a seu lado.
- White Feather de Suzanne Stutman. - E sorriu, passando a mão pela capa do livro, como se o mesmo lhe fosse muito querido e especial - São poemas. Uma jornada para a paz, segundo a autora.
- E a Matilde, o que acha?
- Não sei. São apenas palavras de conforto e de esperança. Às vezes é tudo o que basta, não concorda?
- Sim. Às vezes é tudo o que basta.
Helga, Fevereiro 2011


HOPE

When I am happy, all the Earth sings with me
Flowers burst with joy, birds circle the Sky
And life has meaning for Everyone
For I deserve no less than this:
Peace and Happiness


(Suzanne Stutman in 'White Feather')

3 comentários:

Ava disse...

Uáu, mais um belo e magníficos dos teus contos. É sempre um prazer ler e sentir as tua palavras como se vivesse cada personagem...
Adorei!!!

Beijinhos doces, Ava

By Me disse...

Exatamente...conforto e esperança, duas palavras muito importantes...é tão bom sentir alento, ternura,carinho,simpatia .... os melhores alimentos!!!

Beijinhos

Brown Eyes disse...

Há tanto tempo que não lia uma história tua! A natureza, a vida no campo faz milagres o problema é quando temos que partir. Como dizes e bem vamos sempre a tempo de fazer as coisas que nunca fizemos. Beijinhos