A fantasia não é exactamente uma fuga da realidade. É um modo de a entender.
(Lloyd Alexander)



domingo, 21 de março de 2010

Uma Casa da Cor do Destino


Ana era uma mulher comum, com medos comuns e aspirações comuns. De caracóis perfeitos como fios de chocolate aveludados, tinha um brilho especial nos olhos negros e cheios de vida. Um brilho sonhador e optimista, que lhe espelhava na tez mestiça a luz da sua alma. Foi sem perder esse brilho, pleno e confiante no olhar, que pegou na resumida bagagem que trazia com ela e subiu os singelos degraus que a separavam da casa, que de ora em diante seria o seu pequeno grande mundo. 

Era uma casa soalheira de chão de pedra e paredes pálidas, forradas com motivos florais gastos e desvanecidos pelo tempo. Presas nas janelas, as longas cortinas de renda antiga, também elas marcadas pelo tempo, balançavam suavemente com o sopro da aragem morna do dia, como os véus de uma noiva feliz e invisível. No meio do salão jazia uma velha poltrona de cornucópias douradas e braços de madeira gasta. Uma poltrona esquecida ou simplesmente deixada para trás, junto à lareira apagada e repleta de histórias contadas ao serão.
 
Era a casa mais bonita que Ana alguma vez vira. E depressa a tornou ainda mais especial. Apanhou os longos caracóis num arrematado rabo-de-cavalo e arrancou das paredes um passado que não era seu.  Sujou o cabelo e salpicou a roupa de cores quentes e intensas. Laranja pela liberdade que sentia e verde tília pela paz que lhe inundava o espírito. Azul pelo sorriso que não conseguia esquecer. Um sorriso mais bonito que aquela casa, que era a casa mais bonita que alguma vez vira.

Perguntava-se a si mesma de que cor queria pintar o seu futuro, quando o viu passar entre trinchas e latas de mil cores, no corredor da loja de tintas. De camisola azul e jeans gastos, ele sorriu-lhe, como se ela fosse aquela por quem há muito ele esperava e como jamais alguém lhe havia sorrido antes. Naquele instante Ana teve a certeza da cor que procurava. Era a cor da blusa dele. Azul seria para sempre a cor daquele momento. Azul seria a cor do seu destino.

Helga, Outubro 2008

9 comentários:

lolita disse...

Mais um momento mágico, uma inspiradora nostalgia. Tens um dom com que muitos poucos são abençoados, não o desperdices.

Adorei as recordações que as tuas palavras me deram, e mais uma vez me fizeram ver que palavras e que sonhos quero eu escrever, viver e ler.

Desejo-te muito, mas muito sucesso para esta planície e que voltes em breve a retomar as tuas palavras e os sonhos que ainda não sonhastes.

Um grande, grande BeiJJJJJo, Ava

GizeldaNog disse...

Que luxo! Adorei...já estive nele com outro layout e não consegui postar...mas,voltei.
O que eu quero dizer é: vc ainda não pensou em juntar seus lindos textos em um livro?Eles estão merecendo.

Sensibilidade e talento não lhe faltam...então falta o quê?

Beijos.

Lady Me disse...

Parece que também tens outro cantinho. Escreves mesmo muito bem, adorei o texto! E claro que não me importo que me acompanhes no I'm a Lady! também, é um gosto e ainda bem que gostaste!

Beijinhos! Vou ficar por aqui também!

Brown Eyes disse...

Não conhecia este teu blog. Descobriu-o hoje. Linda história de uma vida, tão simples como a vida que retratas. Beijinhos

Unknown disse...

Olá Helga! Parabéns por este novo espaço, está muito muito acolhedor e a história linda e cativante... kisses

GizeldaNog disse...

Não sei se vc é a criadora desses templates, mas , além dos belos textos, esse blog é um presente pela delicadeza das imagens.
Vir aqui é uma delícia.
Bjs

Anderson Fabiano disse...

helga,
um texto simplesmente encantador.
preciso voltar mais vezes, por aqui.
meu carinho,
anderson fabiano

http://amo-sim.blogspot.com
http://letras-profanas.blospot.com

Petit Leaves disse...

Acabei de encontrar este te novo cantinho. Bonito, cheio de poesia... adorei.

Um beijinho...

mz disse...

Azul seria a cor do seu destino...

(vou continuar a ler....)

bjs